A ultrapassagem da linha Zêzere-Tejo, mais que pela reconquista das armas, através de uma efectiva ocupação e reorganização dentro do quadro do reino português, corresponde a uma nova fase da história do nosso municipalismo, com o aparecimento de um novo grupo de forais, que se designam como de Évora, por ser esta a primeira localidade a que foi outorgada uma carta desse tipo, servindo depois de modelo a um grande número de outras, no Alentejo e na Beira Baixa.
O foral de Évora foi outorgado, após a reconquista definitiva da cidade, em 1166. O diploma não se apresenta como uma absoluta novidade, pois o outorgante declara que concede aos moradores “forum et costume de Avila”. Dá-se uma situação idêntica à dos forais do distrito da Guarda e do Alto Douro, que já conhecemos. É que, tal como o foral de Salamanca, o de Ávila não existe. Mas mais do que esta coincidência, o diploma eborense tem outros aspectos comuns aos daquele grupo. Já se apontaram alguns pontos de contacto entre os forais breves que seguem o modelo dito de Salamanca e os de Évora. Creio que não houve comunicação directa entre os dois modelos, mas as afinidades explicar-se-ão pelo facto de ambos derivarem de antepassados comuns, cuja identidade só poderá vir a ser conhecida quando se aprofundar o estudo de algumas famílias de forais de além fronteira. O foral de Évora, assim como o de Numão, tem muitas afinidades com certos forais de Castela a Nova e da Extremadura castelhana, mas também com outros de áreas tão longínquas, como as terras aragonesas: para o comprovar, é suficiente ler os de Medinaceli, de Calatayud ou de Carcastillo. É que por vezes a guerra e as situações com ela relacionadas aproximam os homens que lutam por causas comuns e ajudam a partilhar as experiências e as soluções encontradas para responder aos mesmos problemas. E estes forais contêm disposições características das regiões de fronteira, num período de rápido avanço da reconquista e em áreas adequadas à formação de extensos concelhos, onde também importava atrair ou fixar povoadores.
Independentemente do tipo de organização que em séculos posteriores podem ter adoptado o município de Évora e os outros que receberam a mesma carta de foro, aqui interessa-nos saber como, após a outorga do diploma, se estruturava a vida local, de modo aliás muito diferente daquele que é descrito por Herculano e Torquato Soares.
1.1. A organização local.
A única ocasião em que o foral de Évora usa um nome menos genérico, para designar os membros do município, chama-lhes vizinhos. Tal como em Numão, jamais se utiliza a expressão “homens-bons”. A solidariedade entre os vizinhos é defendida pela aplicação de coimas aos que se apresentem como “vozeiros” por moradores de fora do município, isto é como procuradores e defensores dos seus interesses, contra os que vivem em Évora.
Na organização da vida local, como, por regra, na dos municípios até agora estudados, um lugar importante cabe ao concelho, embora as alusões do foral sejam relativamente escassas, para que se possam definir com precisão todas as suas atribuições. Concretamente, sabemos que o concelho recebia parte das coimas correspondentes aos delitos por perturbação da ordem pública (como em Numão, agressões por ocasião de concentrações populares: assembleia do concelho, igreja, mercado), assim como das que resultassem da indevida efectuação de penhoras, o que supõe a reserva de jurisdição, por parte do concelho, de importantes aspectos da vida quotidiana: a manutenção da ordem pública e a administração da justiça, em cujo decorrer tinha, como já vimos, um papel essencial o processo da penhora.
Dentro do município, o cargo mais importante é o do juiz, cujas atribuições fundamentais já conhecemos dos outros forais, especialmente dos do grupo da Guarda. O foral não fornece indicações claras sobre o órgão a que compete a sua nomeação; mostram-no, porém, mais ligado aos interesses do palácio, de que é “vozeiro”, isto é, delegado ou procurador nato (“Por totas querelas de palacio el iudice sedeat vozeiro”), o que diminuiria consideravelmente a autonomia e a isenção de um magistrado de eleição municipal. A área da sua jurisdição tinha uma considerável amplitude geográfica, repartida em várias colações, e esse facto explica a necessidade de ter mais do que um magistrado no exercício destas funções, como atestam os documentos do século seguinte, especialmente os “costumes” ou foros extensos.
O foral de Évora afasta-se dos do distrito da Guarda e Alto Douro, e, em geral, dos outros, até aqui estudados, ao dar um lugar maior à intervenção do poder central. Daí que além do saião, que não era mencionado no foral de Numão e afins, e cuja escolha era local (estabelece-se como condições excludentes do exercício do cargo o ser “gentile aut eredero”), apareça o meirinho, que, em datas anteriores, tínhamos encontrado apenas no foral do Porto, no de Seia, no de Banho, e no de Numão apenas em sentido exclusivo, isto é, para afastar a hipótese da sua intromissão em assuntos do município. Em vez de meirinho, o foral da Covilhã e seus derivados chamar-lhe-ão mordomo.
O palácio, ou, muito concretamente, o rei não limita, por conseguinte, o seu papel à recepção dos impostos ou de parte das coimas, mas tem, pelo menos nesta fase, uma intervenção directa na vida do município. Era, aliás, o rei o único senhor que o concelho reconhecia, segundo estabelece uma cláusula bastante semelhante a outras dos forais de Coimbra: “Barones de Elbora non seam en prestamo dados”.
1.2. A sociedade.
As características que marcam a sociedade em que se integravam estes varões assemelham-se às de Numão, embora algumas disposições a ela relativas possam derivar dos forais conimbricenses ou mesmo serem tributários de outras experiências. Assim, como em Numão, os “miles” ou cavaleiros de Évora, perante a justiça, têm o seu estatuto equiparado ao dos podestades e infanções (“de Portugal”, acrescenta o diploma, talvez redigido tendo na frente uma outra carta, de procedência estrangeira, onde, por exemplo, se poderia falar dos infanções de Aragão...). Mas enquanto em Numão e afins, apenas sobre a terça parte impendia essa obrigação, aqui, porque naturalmente as circunstâncias o exigem, em cada ano dois terços dos militares devem participar no fossado. O prazo para a aquisição de outro cavalo, após a perda do anterior, mantém-se limitado ao máximo de um ano. Esta cláusula, com variantes em relação ao prazo, encontra-se no diversificado grupo dos forais influenciados pelo de Coimbra, mas, nos da família que segue o modelo dito de Salamanca, apenas se encontra no de Freixo e seus derivados.
Os peões vêem igualmente o seu estatuto elevado ao nível do dos cavaleiros vilãos de outras terras, e, à semelhança do que já estabelecia o foral de Penela, em 1137 (mais uma vez com a reserva de, em Penela, poder tratar-se de uma adenda posterior), os peões que gozarem de um determinado estado económico (possuir aldeia, isto é uma propriedade agrícola de certas dimensões, um jugo de bois, quarenta ovelhas, um asno e dois leitos) não só podem mas devem ascender à categoria superior, mediante a aquisição de um cavalo.
Como o foral de Numão, o de Évora admite a existência de solarengos ou “vassalos” em solares e herdades, determinando que sirvam apenas, “de tota sua facienda”, ao senhor de solar, sem que no entanto fique claro se este exercia em relação a eles a função de administrar a justiça, embora se possa presumir que, atendendo ao caracter predominantemente régio dos órgãos judiciais, estes chamassem a si o julgamento de todos os crimes graves. Estará em correlação com esta norma a disposição que iliba o respectivo amo de qualquer responsabilidade pelo homicídio cometido fora da vila por um “mancebo”, isto é, por um dependente seu, que após o crime se pôs em fuga. Entre os dependentes podiam contar-se o cozinheiro (“conducterio”), o hortelão, o rendeiro (“quarteiro”), o moleiro, e o “solarengo”.
Como é regra geral, equipara-se o estatuto dos clérigos ao dos cavaleiros. Mas o foral refere-se também a outros grupos sociais: mercadores cristãos e mouros, e “viatores” ou almocreves. Há ainda mouros escravos, que são transaccionados no mercado, que se redimem ou fazem acordos, com os seus donos, em ordem à obtenção de liberdade.
1.3. Economia e fiscalidade.
Uma das características principais desta carta de foro, que faz dela um típico foral de terra de fronteira, ainda que depois venha a ser reproduzida noutras que o não serão do mesmo modo, é a leveza da carga fiscal imposta aos moradores. Apenas dos lucros resultantes de alguma actividade bélica – fossado, “guardia”, “algara”, lide, “azaria” – se paga imposto: a quinta, sem qualquer “ofreição”, e depois de deduzidos os prejuízos sofridos com a morte dos cavalos. Não há qualquer imposto sobre a produção agrícola ou sobre a caça, as oficinas dos mesteirais e as lojas de comércio (tendas), e também os fornos e os moinhos estão isentos de tributo. Portagens e montádigo só pagam os mercadores ou os ganadeiros de fora que exercerem as suas actividades dentro do termo do município.
Podemos afirmar que o foral de Évora, no aspecto fiscal, decalca os burgos do norte do país, até na própria tabela das portagens. Como nos burgos do norte do país e em Numão, a receita das portagens cobradas aos mercadores vindos de fora é dividida em duas parcelas: dois terços destinam-se ao cofre régio e um terço reverte a favor do dono da casa onde o mercador se instalou, e a partir da qual efectua os seu negócios.
Além destes, o único imposto, a que se faz referência, é a “quinta” dos despojos de guerra, resultante das sortidas em terras de sarracenos.
MAPA TRIBUTÁRIO
TAXAS |
ARTIGOS |
1 morabitino |
carga de coelhos, de mouro |
5 soldos |
carga de coelhos, de cristão |
5 » |
panos de cor, trouxel de cavalo |
5 » |
fustões, trouxel de cavalo |
5 » |
carga de cera |
5 » |
carga de azeite |
1 soldo |
panos de lã ou linho, trouxel de cavalo |
1 » |
mouro vendido no mercado * |
1 » |
cavalo, em “açougue” (mercado) |
1 » |
mulo, em “açougue” (mercado) |
1 » |
pescado, carga [de cavalo] |
6 dinheiros |
pescado, carga de asno |
6 » |
asno |
6 » |
boi |
2 » |
porco |
2 » |
furão |
2 » |
couro de vaca ou de zebro |
1 » |
carga [de pão ou vinho?...], de peão |
3 mealhas |
carga de pão ou de vinho |
3 » |
carneiro |
3 » |
couro de cervo ou de gamo |
1/5 » |
despojos de guerra contra os sarracenos |
* À importância que um mouro pagasse pela sua libertação
ou fixasse em acordo, nesse sentido,
com o seu amo, aplicava-se uma taxa correspondente à décima parte.
Nas disposições de índole fiscal colhemos os parcos elementos de que dispomos para conhecer a economia local: cultivam-se cereais, que é para os moer e da farinha fazer pão que servem os moinhos e fornos, e há rebanhos de ovelhas e manadas (“bustos”) de vacas, pertencentes aos moradores e aos estranhos, que pastam no termo concelhio. Os montados são de toda a comunidade local, e, por isso, quem deparar com estranhos a roubar lenha tem legitimidade e mesmo obrigação de lha tomar. Na cidade há “tendas” ou lojas de comércio, almocreves que transportam mercadorias e negociantes de fora que chegam e partem com trouxas de panos, couros, animais, vinho, azeite e cera. A única alusão à caça está na indicação da portagem a pagar pela transacção de um furão. Quase despercebida passa a referência ao mercado – é uma das três circunstâncias onde há concorrência de gente, e por isso, as agressões aí feitas, como perturbações que são da ordem pública, têm uma penalidade especial, tal com sucedia no foral de Numão.
1.4. A justiça.
O foral de Évora não é tão rico em disposições jurídicas como os que seguem o paradigma salamantino, embora também sob este aspecto haja entre os diplomas relativos às duas áreas consideráveis afinidades:
– Como observamos, é ao concelho que compete velar pela ordem pública, cabendo ao juiz a tarefa de julgar os crimes e litígios, e, em consequência, convocar as partes, que devem comparecer “a sinal de iudice”, e determinar as penhoras a executar pelo saião, como garantia do cumprimento do direito.
– Para dirimir as questões de justiça, mesmo com homens de outra terra, não era suficiente apoiar a sentença (iudicium) nas declarações (firma) dos implicados, ainda que acompanhadas de juramento, mas era necessário proceder à inquirição das testemunhas (esquisam), ou então recorrer ao duelo ou lide (reto): “si homines de Elbora habuerint iudicium cum homines de alia terra non currat inter illos firma sed currat per esquisam aut reto”.
– O juramento é admitido como prova abonatória em favor do acusado de rouso, delito que normalmente era difícil comprovar com testemunhas. Quando uma mulher clamar que alguém a violentou, deve apresentar (“det in outorgamento”) três homens do mesmo nível social do acusado, para abonarem a credibilidade da queixosa. O acusado, para se livrar da incriminação, tem de acompanhar o seu juramento de que está inocente com a apresentação de doze testemunhas abonatórias. Se, porém, a mulher não apresentar as suas testemunhas, o acusado ilibar-se-á apenas com o seu juramento.
– A responsabilidade pelos subalternos limita-se ao período em que eles se mantenham na dependência do seu patrão, de tal modo que este, se algum seu “mancebo” matar alguém fora da vila e depois fugir, não é obrigado a pagar a coima correspondente ao homicídio. Em contrapartida, se matarem algum dos seus “solarengos”, o amo tem direito a receber a indemnização ou coima relativa ao homicídio, retirada a sétima parte que é devida ao palácio.
– Admite-se a ilibação por feridas ou até mortes provocadas em defesa dos próprios haveres, contra alguém que venha de fora da povoação (vila) tomar pela força bens ou alimentos. É possível que esta cláusula, cujo objectivo primordial são os ladrões, inicialmente tivesse em mente os extorsionários, que em nome de presumíveis direitos exigiam prestações aos moradores dos lugares.
– Distingue-se, concretamente no caso de furto, o delinquente habitudinário e incorrigível, daquele que apenas ocasionalmente cometeu um delito e até do que, tendo-se já corrigido, e passado mais de um ano, reincide na mesma falta.
A tabela das coimas aproxima-se bastante da do foral de Numão e seus afins, mas tem algumas peculiaridades, como se vê no mapa anexo.
DELITOS E COIMAS
COIMAS |
DELITOS |
DESTINATÁRIOS |
|
300 morabitinos |
rapto |
pais |
1/7: palácio |
100+60 soldos |
penhorar mercador ou almocreve |
½: concelho |
½: rei (60 soldos ao lesado) |
100 morabitinos |
extorsões |
½: concelho |
½: reia) |
[700 soldos] |
homicídio |
família |
100 s. ao palácio |
[700 “ ] |
homicídio de solarengo |
patrão |
1/7: palácio |
300 “ |
rouso |
lesado |
1/7: palácio |
300 “ |
abandonar marido |
juiz |
|
300 “ |
ferir mulher na frente do marido |
[marido] |
1/7: palácio |
200 “ |
violação do domicílio |
[lesado] |
1/7: palácio |
100 “ |
mutilações – cada olho, braço, dente |
lesado |
1/7: palácio |
60 “ e o dobro do valor |
fiel mentiroso, testemunha falsa |
? |
1/7: palácio |
60 “ e o dobro do valor |
penhora ou roubo de gado doméstico |
palácio |
dobro do valor dado ao dono |
60 soldos |
penhora no monte |
[conc.?] |
1/7: palácio (b) |
60 soldos |
ferir em público |
6/14: conc. |
8/14: pal.(c) |
20 “ |
ferida com lança ou espada, trespassando |
queixoso (ferido) |
|
10 “ |
idem, sem tresp. |
“ |
“ |
10 “ |
ser vozeiro contra vizinho por estranho |
[conc.?] |
1/7: palácio |
10 “ |
falta de cavaleiro a apelido |
vizinhos [=concelho] |
|
5 “ |
idem, de peão |
“ |
|
5 “ |
mudar extremas ou marcos |
[conc.?] |
1/7: palácio |
1 “ |
desobedecer à convoc. do juiz |
juiz |
|
1 “ |
resistir a penhora do saião |
juiz |
|
1 “ |
infidelidade à mulher |
juiz |
|
1 dinheiro |
deixar a mulher |
|
|
1 carneiro |
montar cavalo alheio... 1 dia |
dono |
|
1 soldo |
idem, mais por cada noite |
“ |
|
1 dinheiro |
idem, idem, dia |
“ |
|
9 vezes o valor |
furto |
2/9: lesado |
7/9:palácio |
a) Os 100 morabitinos, em que se traduzem as coimas por “penhorar...” e “extorsões”, correspondem à violação do couto (“pro cauto quod fregit”).
A expressão “extorsões” é a simplificação do delito descrito como “vir à vila receber pela força alimentos ou outras coisas”.
b) A “quem for penhorar
ao monte, quando na vila tinha coisas para penhorar”: a penhora no monte era
feita em gado, e a intenção do foral
será a de evitar que se apreendesse gado enquanto houvesse outros bens passíveis de serem penhorados.
c) Ferir em público: para o palácio, 1/2, mais 1/7 da outra metade; para o concelho, 1/2 menos 1/7 que é dado ao palácio.
2. Fortuna do foral de Évora
O foral outorgado a Évora propagou-se, numa primeira fase, a um grupo de municípios que, mais a noroeste, se seguiam, na margem direita, à linha do Tejo: Abrantes; Coruche, de onde será transmitido a Benavente; Palmela, Sesimbra.
Com a outorga das cartas de Montemor-o-Novo, Alcácer do Sal, Avis e Marvão, inicia-se uma nova fase de expansão deste foral, através do alto e médio Alentejo, em cujas terras foi o mais adoptado.
A proximidade geográfica e, algumas vezes, a identidade da instituição outorgante, sob cuja jurisdição imediata a localidade se encontrava, determinaram o modelo a ser directamente seguido:
a ordem de Santiago outorgou a Aljustrel e a Garvão o foral de Alcácer do Sal, e o de Palmela a Canha e a Setúbal, enquanto a Mértola deu um foral misto, isto é, que na maior parte das cláusulas imita o de Évora, com excepção das que respeitam ao rio ou ao mar, em que segue o de Lisboa;
a ordem de Avis deu a Seda a carta de foro, que antes outorgara aos moradores da vila onde instalara a sua casa mãe;
aos Hospitalários deve-se o foral de Proença-a-Nova, assim como o do Crato, que utilizou como modelo o de Nisa e, por sua vez, serviu de padrão ao de Tolosa.
O de Alter do Chão é promulgado pelo bispo de Idanha, tomando por modelo o de Abrantes, e o de Alcáçovas pelo Bispo de Évora, seguindo o paradigma da cidade onde estava a sede episcopal.
De outorga particular são o que por Egídio Martins foi concedido a Terena, e o que por João Peres de Aboim foi outorgado a Portel.
Trinta anos após o seu aparecimento, o foral de Évora servia de modelo, com ligeiras alterações, ao de uma outra localidade, situada mais à norte, a Covilhã, que se ia transformar em novo foco de irradiação para quase toda a Beira Baixa. A expansão deste foral inicia-se com o de Centocelas, prossegue com os de S. Vicente da Beira, Belmonte, Alpedrinha, Teixeira, Sarzedas, Vila Nova [Manteigas], Vila Nova [Proença-a-Nova] e Lardosa, e ulteriormente, com os de Oleiros e Proença-a-Nova.
O pormenor mais característico dos forais do subgrupo que segue o paradigma da Covilhã é a citação do mordomo, não casualmente nem por lapso, porque em todos se repete, no lugar onde os outros mencionavam o meirinho.
Situando-se, embora, na Beira Baixa, numa área onde a influência do protótipo eborense já tinha marcado o de Monsanto, o foral de Penamacor, com os outros que dele derivam, não segue o modelo da Covilhã, pois constitui uma criação especial, que resulta da fusão da maior parte dos preceitos do de Évora com outros dos do grupo derivado de Salamanca e algumas cláusulas específicas. Não encontramos aí o saião e, em contrapartida, deparamos com uma organização administrativa e judicial onde, além do concelho, se distinguem o pretor e o juiz, e aparecem os alcaldes, enquanto, em vez das colações de Évora, se mencionam, pela primeira vez, os sesmos. Outra característica destes forais é a preocupação em definir os direitos eclesiásticos. O foral de Penamacor serviu de paradigma aos de Proença-a-Velha e de Penha Garcia; por sua vez, o de Proença-a-Velha foi seguido pelos de Sortelha e este pelos de Idanha-a-Velha e de Salvaterra do Extremo.
O de Castelo Branco cita como modelo o de “Elbis”, devendo-se tratar-se de um lapso do escriba, por “Elbora” (Évora), uma vez que o de Elvas, que segue também o de Évora, é dezasseis anos mais recente e só mais tarde foi modelo de outro, o de Arronches.
Pinhel, que recebeu foral copiado directamente do modelo de Évora, em 1209, é a povoação situada mais a norte, inteiramente isolada de todo este conjunto.