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Apêndice: carta de foro e foral

 “CARTA DE FORO” E “FORAL”


1

 De diversos modos aparecem designados desde o século XI até às primeiras décadas do século XIV, isto é, durante o período em que foram outorgados, quase na sua totalidade, os documentos a que actualmente chamamos forais.

O mais vulgar até ao fim do século XII – e a mesma prática manter-se-á em vários documentos do século XIII – é chamar ao documento simplesmente “carta”, enquanto se refere ao seu carácter externo, à sua realidade diplomática; e referir o seu conteúdo, isto é, o conjunto das disposições e normas nele contidas, como “foro” ou “forum”.

Convém, no entanto, observar que o termo “foro” ou “forum” aparece repetidas vezes, em muitos desses e em outros documentos, aplicado também a realidades diferentes, significando ora o conjunto das prescrições contidas no documento, ora as taxas das portagens, ora o estatuto social e jurídico de uma determinada classe, ora, finalmente, as rendas a pagar sobre as propriedades rústicas ou urbanas, e, dentro desta acepção, muito especificamente, a importância fixa ou “cânone” a pagar anualmente pelo domínio útil das terras, como sucede nos contratos de enfiteuse ou emprazamento, também chamados de aforamento. Assim, por exemplo, se no foral de S. João da Pesqueira "forum designa o próprio diploma (“Istud vero forum firmavit rex domnus Fernandus”), no foral de Évora, de 1166, encontramos “forum” a designar o conjunto das disposições que integram o foral (“Damus vobis forum et costume de Avila”), o imposto das sisas ou portagens (De portagem: foro de trosel de cavalo, de panos de lana vel lino, I solidum”), o estatuto próprio de uma classe (“si miles per naturam ibi perdiderit equum et recuperare non potuerit semper stet in foro militis”), enquanto no foral de Aguiar da Beira [1157-1169], entre outras, se lê esta passagem: “pedon vendat suam proprietatem ad quem voluerit et decimam restet in foro”, onde “foro” designa o imposto da décima que recai sobre a propriedade. Não se esqueça que nesta época nem sempre é fácil distinguir aquilo que hoje chamamos foral de um simples contrato de enfiteuse, não só por causa da imprecisão das fórmulas notariais, mas também por falta de clareza na distinção entre os direitos individuais de propriedade e o domínio político.

Os notários ou, de um modo geral, os escribas dos séculos XI e XII não tinham uma designação precisa reservada às cartas de foral e por isso aplicam-lhes as mesmas com que referiam os outros documentos. Tais designações têm muito a ver com a imprecisão ou a versatilidade das fórmulas notariais da época, com os hábitos e tradições dos scriptoria ou da chancelaria onde foram elaborados tais diplomas.

A umas está subjacente o aspecto externo ou o suporte material do documento, outras traduzem a sua força vinculativa, a sua eficácia, outras referem-se ao seu conteúdo.

 

1.1. A designação mais simples com que se apresentam alguns forais é, já acima referimos, a de carta ou cartam (Sernancelhe, 1124; Valezim, 1201). Numa passagem do primeiro foral de Melgaço, acrescenta-se uma segunda palavra, quase sinónima: cartam et scriptum. Associado à palavra cartam aparece o vocábulo scripturam, nos forais de Numão, em 1130 (“facimus vobis cartam sicut et fecimus per scripturam”), e de Freixo de Espada à Cinta, em 1152 (“facimus cartulam sicut et fecimus per scripturam).

1.2. A carta de foro de Covas, em 1162, numa passagem que tem paralelo nas arengas de outros documentos da época, teoriza assim o valor do documento escrito: “Magnus est enim titulus donationis in qua nemo potest actum largitatis inrumpere neque foris legis projicere sed quicquid libenter amplecti. Denique lex canet gotorum ut rem donatam si presentibus tradita fuerit nullo modo repetatur a donatore sed per testes et per scripturam convincit”. A redução a escrito de um acto de doação tornará perenes as irrevogáveis cláusulas de doação nele contidas. Por isso mesmo é que os municípios medievais guardarão com todo o empenho os pergaminhos que definiam as suas liberdades e privilégios e, quando, por algum acidente, os documentos antes em sua posse se extraviavam, corriam pressurosamente a solicitar ao rei a pública forma da versão arquivada na chancelaria régia, ou, à falta desta, uma inquirição destinada a exarar por escrito, o mais rapidamente possível, as cláusulas publicamente conhecidas, antes que a sua memória se perdesse. Da importância atribuída aos documentos vêm não só as expressões que em geral acompanham a assinatura – roborare, firmare – e as apocalípticas cláusulas cominatórias, mas também a designação com que se apresentam documentos da mais diversa índole, incluindo muitos dos nossos forais: assim, os forais de Penela (1137) e Arouce (1151) designam-se como cartam donationis et firmitudinis. Com expressões idênticas se qualificam muitos outros:

firmitudinis karta (Fontarcada, 1193);

cartam firmitudinis (Tomar, 1162; Caldas de Aregos, 1183; Valdigem, 1186; Sintra, 1154; Miranda da Beira, 1136);

cartam firmitudinis et stabilitatis (Seia, 1136);

cartam firmitudinis et foro (Valbom, 1203);

cartam et scripturam firmitudinis (Monsanto, 1174);

firmitatis scripturam de bono foro (Viseu, 1123);

cartam [...] fortitudinis et firmitudinis (Arega, 1201);

cartam conventionis et firmitudinis (Ferreira, 1156);

cartam firmitudinis et stabilitatis de foro (Santa Marinha, 1190);

scriptum firmitudinis et stabilitatis ( Seia, 1136);

firmamenti carta (Tomar, 1162);

cartam stabilitatis (Tentúgal, 1108).

 1.3. Pouco vulgar é a designação que aparece nos forais de Ponte de Lima, em 1125 (“decretum facio”), e de Torres Novas, em 1190 (“talia damus decreta”).

 1.4. Em muitos forais, particularmente em vários que foram comunicados de outras terras, usa-se uma fórmula bem simples, que se refere não ao seu aspecto externo ou à eficácia atribuída ao diploma, mas ao seu conteúdo, como sucede, por exemplo, no de Mós, em 1162: “Do et concedo ad populandum (...) per forum de Salamanca”; no de Santa Marta e Viduedo (1202) diz-se: “Damus et concedimus forum de Covilliane”.

1.5. Quando os diplomas incluem já a oficialização do direito elaborado localmente, acrescenta-se a palavra consuetudinem ou costume, como sucede nos forais de

 – Évora, 1166: “Damus vobis forum et costume de Avila”;

 – Centocelas, 1194: “Damus et concedimus forum Covelliane atque consuetudine”.

O foral de Santarém, de 1095, um dos mais antigos em território português, autodesigna-se como “consuetudinis cartam”.

1.6. Desde muito cedo, ao termo carta, referido à realidade diplomática externa, se associa o vocábulo foro, correspondente ao conteúdo jurídico do documento. Curioso, porque muito complexo, procurando recolher quase todas as variantes até aqui referidas, é o foral de Gouveia (1186), que diz “facimus vobis cartulam sicut et fecimus per scripturam et per preceptum nostrum ut firmiter teneatis et habeatis forum bonum"; mas, em regra, utilizam-se expressões mais breves, como acontece no foral de Penacova (1192), onde se lê: “facimus cartam ut habeatis istud forum”.

Por este caminho não era difícil encontrar uma fórmula simples que pudesse ser adoptada para designar especificamente este tipo de documentos. Embora necessitando ainda de ser despojada dos qualificativos, tal fórmula encontra-se já nos forais de Guimarães e Constantim (1096): “cartam de bonos foros”; no singular, achamo-la no foral de Redinha (1159): “carta de bono foro”.

 Da expressão “carta de bono foro” facilmemte se chegaria àquela outra mais simples que gradualmente se generalizará a partir do foral de Leiria, de 1142: carta de foro. Uma dezena de forais, aproximadamente, adoptará esta expressão, até ao fim do século XII, integrada num dos seguintes enunciados:

 – “Hec est carta de foro”: Arganil (1175), Lourinhã (s.d.), Bragança (1187), Guarda (1199);

 – “facio cartam de foro”: Leiria (1142), Germanelo (s.d.), Mortágua (1192);

 – facimus vobis cartam de foro”: Pinhel (1191).


2

 

Ao longo do século XIII, repetir-se-ão quase todas as designações que se aplicaram nos forais do século anterior, como seria de esperar, se atendermos à lentidão com que evoluem as tradições dos scriptoria, ao uso de formulários que se transmitiam de geração em geração e ao simples facto de muitos forais utilizarem outros como modelo ou como referência. Não será até difícil encontrar fómulas híbridas, como estas:

– “facio cartam donationis et firmitudinis de foro”  (Cepo, 1237);

– “facio cartam firmitudinis et perpetui fori” (Vila de  Porco, 1238);

– “facio kartam firmitudinis ad forum” (Mós, 1241).

Estes três documentos são de chancelarias diversas (mosteiro de S. Pedro de Arganil, bispo de Coimbra, chancelaria régia), mas de datas muito próximas.

A fórmula que mais fortuna irá fazer durante o referido século XIII, para designar aquilo a que hoje chamamos forais, será a simples expressão carta de foro, achada já, como vimos, no século anterior. Encontramo-la umas trinta e cinco vezes no preâmbulo dos forais publicados em Portugaliae Monumenta Historica, que, é sabido, abrange apenas, com poucas falhas, os forais outorgados até ao fim do reinado de D. Afonso III. Quando a expressão carta de foro não aparece, usam-se expressões genéricas, aplicáveis a toda a sorte de documentos, ou outras equivalentes, do tipo “do vobis pro forum quod ... “.

Os enunciados em cujo contexto vem inserida a expressão carta de foro são os mesmos que encontrámos no século anterior, com a variante, quando for o caso, de aparecerem em língua vernácula:

– “Hec est carta de foro”: Benavente (1200), Sesimbra (1201), Tabuadelo, Fontes e Crastelo (1202), Souto (1207), Guardão (1207), Penamacor (1209), Contrasta (1217), Alcácer (1218), Touro (1220), Aljustrel (1252);

– “Hec est carta fori et firmissimi pacti”: Proença-a-Nova (1244);

– “Esta he a carta de foro”: Freixiel (1209);

– “Facio cartam de foro”: Vila Nova (1205), Capeludos, Vila Meã e Escarei (todos de 1255), Ferreiros e Melgaço (ambos de 1258), Terena, S. Mamede de Riba Tua (ambos de 1262), Pena da Rainha (1268), Silves (1269), Castro Marim (1277), Loulé, Faro e Tavira (sem datas);

– “Facio cartam de foro perpetue firmitudinis”: Bornes, Sabrosa, Viela e Guilhado (todos na mesma região e de 1255);

– “Facio cartam de foro bono”: Vila Mendo (1229);

   – “Facio carta de foro”: Avelar e Almofala (1221), Tolões de Aguiar (1255);

   – “Facimus cartam de foro”: Vila Chã (1217), Ceides (1217).

 

Aos vizinhos de Padornelos ficou a servir de foral uma sentença régia, proferida na sequência de uma inquirição in loco levada a cabo pelos juiz e tabelião de Barroso, a pedido do juiz de Padornelos, que em nome dos referidos vizinhos se dirigira ao rei, porque “ipsi homines de Padornelos perdiderant suam cartam de foro” (1265).

 

3

 

É nas primeiras décadas do século XIV que se generaliza a palavra foral para designar os diplomas que até essa data aparecem referidos com os nomes de carta de foro, simplesmente de foro, ou alguma das designações atrás registadas.

Encontramos a palavra foral nos capítulos especiais apresentados por várias povoações do reino nas cortes de Santarém, em 1331. Nesses capítulos, e com frequência nos mesmos artigos, usa-se ainda, como equivalente, a palavra foro ou a expressão foro e costumes antigos.

No artigo 6.º dos agravos apresentados por Coimbra, dizia-se que “no foral he contheudo que o moordomo faça dereiito pola dezima a aqueles que demandam seus devedores” e solicitam que se ponha cobro uma prática diferente; em resposta, El-Rei ordena “que se aguarde o foro e costume antigo”.

O concelho de Lisboa reclama, porque não é observado o que “no foral he contheudo que todos mercadores naturaes da villa seja recebuda deles e se soldada non quiserem dar que paguem portagem”. Mais à frente, queixa-se de “que recebeu agravamento do mordomo per esta guisa: en o foral he contheudo que todo vezinho de Lisboa que ante seja chamado e ouvydo que penhorado”, mas os mordomos não respeitam esse direito; em resposta, El-Rei “diz que lhi seja guardado seu foro e o que foy custumado antigamente”. A estes dois artigos somam-se outros sete onde o termo foral aparece com o mesmo significado.

Observe-se que em todos esses artigos, na parte correspondente à exposição feita em nome do concelho, se usa a palavra foral, enquanto na resposta dada por El-Rei se continua a empregar o termo foro, o que denota a origem e difusão popular do vocábulo, a cuja utilização a chancelaria régia opõe alguma resistência.

Também nos capítulos apresentados nas mesmas cortes pelo concelho de Sintra, se encontram as duas palavras. No 1.º artigo usa-se o termo foro: “diziades que aviades voso foro em que nos aviam de dar trinta casaaes (...)”; no artigo 6.º usam-se as duas palavras com o mesmo sentido: “outrosy diziades que aviades no vosso foral que as igrejas de vossa terra ca as dava eu a quem era minha mercee e nom aos vossos naturaaes e que vos as aviades d'apadroar estando voso foro”. Noutros artigos dos mesmos capítulos, a exposição dos agravos menciona sempre o “vosso foral”, mas na resposta nunca se diz foro nem foral, limitando-se a frases como estas:

– “veerey a carta e farey o que devo” (art.º 4.º);

– “mando que se guarde o costume antigo” (art.º 7.º  e 8.º).

 Em 1360, no documento através do qual integrou a terra de Valadares no termo do concelho de Melgaço, D. Pedro I lembra as trezentas libras e os outros direitos que o concelho “he theudo de dar a mim em cada huum ano pello seu foral”.

No ano seguinte, o termo foral volta aparecer na resposta dada pelo rei a uns agravamentos apresentados pelo concelho de Montemor-o-Velho: “Item diziam que eram agravados dos porteiros que levavam daquelles que vendiam os porcos na dicta villa a enxercas seis dinheiros de cada huum porco e que foy ja julgado e defeso per sentença que os nom levasem porque acharom que pello soldo que paga qualquer vizinho que pollo foral da dicta villa que diz que todo vizinho que soldo pagar que nom faça outro foro”. Nesta última frase aparecem com significados totalmente diversos os termos foral e foro, o segundo para designar uma determinada taxa ou renda a pagar, e o primeiro para designar o documento onde se fixa um estatuto jurídico, embora de alcance económico. Advirta-se, porém, que a distinção total entre as duas palavras não está ainda feita, bastando, para o comprovar, prosseguir na leitura do referido capítulo dos agravamentos, onde foro é utilizado na mesma acepção de foral: “E porque foy e é defeso que nom levassem os dictos seis dinheiros dos vizinhos em razam dos dictos porcos porque eram scusados per o dicto foro”.

  O caminho era, todavia, irreversível. Num elenco de documentos constantes da chancelaria régia, elaborado na mesma época, mencionam-se já à maneira moderna o “foral de Vilar de Vaquas” e o “foral dos moradores de Vilarinho da Castanheira”.

Se não deixa de ser utilizada, a palavra foro, que, do século XI ao século XIII, incluía também outros significados, correspondentes a realidades que hoje não se consideram abrangidas na categoria dos forais, passa a ter uma acepção cada vez mais restrita, ligada aos contratos de enfiteuse ou emprazamento.

Foral é a palavra que se generaliza gradualmente, desde os começos do século XIV, para referir aquilo que, em termos diplomáticos, do século XI ao século XIII, se chamou, entre nós, foro ou carta de for.

Epílogo

 1. Datas fundamentais.

O municipalismo é uma das principais linhas de força presentes no processo da formação de Portugal.

Os seus primórdios colocam-se no século XI, com a outorga do foral de S. João da Pesqueira. Além desse momento, outros igualmente significativos marcam as mais importantes fases da história inicial dos nossos municípios:

1) A concessão do foral ao burgo de Guimarães, pelo ano de 1096;

2) A elaboração dos forais de Sátão, Coimbra e Soure, em 1111;

3) A criação da primeira “póvoa” do Entre Douro e Minho, Ponte de Lima, em 1125;

4) O aparecimento do foral de Numão, em 1130, cujas potencialidades se começarão a revelar a partir de 1152, com a expansão territorial na Beira Alta;

5) A outorga do foral de Évora, em 1166, que, na sequência da reconquista, se revelaria o estatuto mais adequado para servir de base à organização dos municípios da Beira Baixa e do Alto e Médio Alentejo;

6) A redacção, em 1179, do foral de Lisboa, Santarém e Coimbra, destinado a servir, sobretudo, os aglomerados urbanos e comerciais de maior movimento, situados no centro e no sul do reino, embora a sua influência se estenda também a outras localidades.

Alguns forais correspondem a estádios intermédios, não só pela colocação cronológica, mas também, e principalmente, como testemunhas de um processo evolutivo, que se relaciona com a mudança dos tempos e as carências específicas das comunidades:

– os forais outorgados entre 1136 e 1137, no interior da Beira Alta, testemunhando um crescente apreço da autonomia local, e não só a expansão económica, a que também corresponde um certo crescimento demográfico, subjacente à migração de alguns grupos, denunciada pela transposição de costumes desta área, para terras mais a sul;

– os forais de Leiria e Sintra, que resultam do avanço das conquistas meridionais;

– os forais de Tomar e seus tributários, fruto da acção organizadora dos Templários, a quem foi confiado o domínio e a defesa desta área, de especial interesse estratégico.

 

        2. Grupos e subgrupos.

 

        As diferenças características dos vários grupos e subgrupos de forais são resultantes do seu momento histórico e do correspondente teatro geográfico.

        2.1. Os forais de origem leonesa.

        O mais antigo grupo é o dos forais outorgados sob o domínio dos reis de Leão e Castela, Fernando I, Magno, e Afonso VI, que, pelo seu teor, se aproximam dos forais leoneses da época, e foram concedidos a três localidades que constituiriam os maiores pilares de uma fronteira geográfica, que avançava desde S. João da Pesqueira, no Douro, até Coimbra e Santarém, nas margens do Tejo. As obrigações fiscais são nulas ou reduzidas ao mínimo, e a autonomia de que gozam o “concelho” ou a “cidade” anuncia uma das principais vertentes do nosso municipalismo.

        2.2. Os burgos.

        A criação e o desenvolvimento dos burgos são fomentadas com os forais de Guimarães, Constantim, Mesão Frio e Caldas de Aregos, que, mediante a protecção concedida aos mercadores, tinham como objectivo a fundação de aglomerados urbanos de reduzido alfoz, mas de activo fervilhar económico, numa região distanciada das frentes de guerra, e já de intensa ocupação territorial, o Entre Douro e Minho e suas redondezas.

        O foral outorgado pelo Bispo do Porto aos habitantes desta cidade, influenciado pelo de Sahagún, do mesmo modo que, mais tarde, embora com menos sorte, o de Melgaço, instituía uma povoação, de índole burguesa, mas com uma forte componente rural. Talvez esse exemplo influenciasse a criação, na mesma área, de algumas póvoas, onde é grande o peso da ruralidade, mas, ao mesmo tempo, se criam estímulos ao desenvolvimento da actividade mercantil.

        2.3. Forais outorgados na órbita de Coimbra.

        O foral outorgado a Coimbra, em 1111, estabelece um marco fundamental na história das origens do nosso municipalismo, porque é uma resposta da autoridade central aos cidadãos sublevados por verem os seus direitos e liberdades espezinhados. Embora só venha a ser reproduzido à letra pelo de Tomar, em 1162, torna-se, desde o início, o ponto de referência da maioria dos forais da região central do país. Os municípios das margens do Mondego coincidirão durante muito tempo com a mais avançada linha da fronteira portuguesa.

        O foral de Seia, de 1136, revela uma crescente animação económica, de que igualmente dão testemunho os forais de Ferreira de Aves e de Sernancelhe. Esta expansão traduz-se na diversificação das actividades económicas, na consequente diversificação social, e também no aspecto militar, com o aparecimento dos besteiros, e está relacionada com o prosseguimento da expansão territorial na direcção do leste e do sul, testemunhada em primeiro lugar pelos forais de Leiria e de Sintra – mas também com repercussões negativas, como os problemas a que procuraram dar resposta as “Posturas” coimbrãs de 1145.

        Para garantir a defesa e a reorganização da área situada entre Coimbra e o Tejo, correspondente a uma importante zona de penetração, D. Afonso Henriques doou aos Templários o território que englobava as margens do Nabão e do Arunca. O mestre da Ordem do Templo, tendo outorgado a Tomar uma carta de foro que repetia o paradigma coimbrão de 1111, sentiu depois a necessidade de lhe anexar outro diploma, a regulamentar a aplicação da justiça.

        2.4. Os forais do grupo de Numão.

        O foral outorgado a Numão, em 1130, inicia, em meados do século, a sua difusão nas terras, então fronteiriças, da Beira Alta, revelando-se adequado ao governo de municípios com amplo alfoz territorial.

        2.5. Os forais do grupo de Évora.

        A conquista do Alentejo determina o aparecimento de um novo tipo de foral com múltiplos pontos de contacto com os forais anteriores, especialmente com os do grupo de Numão, o de Évora, destinado a servir de base à organização de extensos territórios, polarizados à volta de centros urbanos de maior ou menor dimensão.

        2.6. O foral de 1179.

        Recolhendo o contributo de experiências anteriores, em 1179 aparecia um novo tipo de foral, o de Lisboa, Santarém e Coimbra, onde se denota o caminho para a maior complexificação administrativa, própria das grandes cidades (e a consequente preocupação em rentabilizar as hipóteses de receita fiscal), ainda que posteriormente venha a ser outorgado a localidades com menor expressão urbana.

        2.7. Os forais da terra de Panóias.

        A norte do país, ensaiava-se, na área do actual distrito de Vila Real, ou nas terra de Panoias e Aguiar de Pena, com moderada expansão também na margem sul do rio Douro, uma nova fórmula, com a criação de pequenas comunidades, dotadas de grande autonomia, e dependentes, apenas em casos excepcionais, no âmbito da justiça, de um juiz, cuja autoridade se estendia a um vasto território.

        2.8. Os forais do nordeste.

        A zona nordeste do actual distrito de Bragança, em cuja faixa meridional, nas margens do Douro, alcançaram expressiva fortuna as cartas de foro no estilo das de S. João da Pesqueira e de Numão, vê, ao aproximar-se a última década do século, um novo tipo de foral, tributário dos modelos de além-fronteira, designadamente de uma tradição que enraizava nos forais de Castrojeriz – de carácter excepcionalmente favorável, cumulando os moradores de isenções e de imunidades – o qual teve limitadíssima expansão, talvez mesmo por restrição do poder central.

        2.9. O contributo dos estrangeiros.

        Os forais outorgados a algumas colónias de estrangeiros, fixados na Estremadura e no Ribatejo, nada apresentam de verdadeiramente específico, enquadrando-se, de um modo geral, na tradição coimbrã, sobretudo na variante transmitida pelos primeiros forais de Leiria e de Sintra.


        3. As estruturas municipais.

 

        A análise pormenorizada dos textos permitiu-nos encontrar os elementos comuns à maioria destes forais, os quais se podem considerar a base da instituição municipal, assim como registar as diferenças características dos vários paradigmas e respectivas áreas regionais, a nível do xadrez social, da organização civil, da estrutura económica e da correspondente fiscalidade.

        3.1. O concelho.

        A existência do concelho e a autonomia total ou parcial com que age na resolução dos problemas locais é o cerne de todos estes forais e pode considerar-se a base ou a essência da instituição municipal. Cronologicamente, o concelho é também a primeira de todas as instituições municipais, de tal modo que ele existe, mesmo em localidades onde se não faz menção de qualquer outra figura da autoridade ou administração. É geralmente constituído pelos homens-bons, isto é, pelos homens livres, chefes de família, sem vínculos de sujeição pessoal em relação a qualquer amo ou senhor, e moradores na localidade; por vezes, é constituído por todos os vizinhos, isto é, pelos moradores livres e de maior idade.

        3.2. O juiz e o alcaide.

        A maioria dos municípios, pelo menos a partir de uma certa dimensão, têm um juiz. Em alguns forais do centro do país, em vez do juiz, cita-se o alcaide, o que corresponde à acumulação das funções administrativas e judiciais com as da defesa militar.

A partir de meados da década de trinta, um número crescente de municípios obtém o reconhecimento do direito de escolherem o juiz que actuará no respectivo termo.

        Quando se trata de comunidades muito pequenas, ou o concelho exerce in solidum as tarefas correspondentes à função do juiz, ou então, como sucede na terra de Panóias, o município depende de um juiz externo, de nomeação régia ou senhorial, conforme a situação, o qual, na maior parte das vezes, tem jurisdição sobre um território mais vasto, aonde só é chamado e só pode intervir em casos muito excepcionais: delitos graves, que não é possível resolver na localidade ou de cuja resolução os implicados tenham direito a fazer apelo.

        3.3. Alcaldes e alvazis.

        Em contraste, dentro de municípios com alfozes mais extensos, divididos em várias “colações”, ou com comunidades muito numerosas, vemos aparecer um corpo de magistrados, cujas funções são as de ajudar o juiz, ou, em certos casos, de o substituir: os alcaldes, nos municípios do grupo de Numão (e na zona de Ribacoa, que, por não fazer então parte do território, não incluímos nesta investigação, deixando o seu estudo para outra oportunidade); os justiças no subgrupo de Tomar; os alvazis, no grupo de Lisboa. A tendência para multiplicar o número dos magistrados estender-se-á também aos forais derivados do de Évora, com a criação de alcaldes, no subgrupo da Covilhã (por influência da zona da Guarda), ou com o aumento do número dos juízes, nos municípios a sul do Tejo.

        4. Funcionários municipais: o saião, o pretor, o mordomo, o meirino, o porteiro.

        O mais antigo funcionário a quem se atribuem funções policiais dentro dos municípios é o saião; a competência para nomear o saião anda correlacionada com a de nomear o juiz. Em geral não há saião nos pequenos municípios, que também não têm juiz próprio, e onde o concelho in solidum zela por todos os aspectos da ordem pública, nem naqueles, da Beira Alta (grupo de Numão), onde um número suficiente de magistrados, os alcaldes, encarregados não só de funções judiciais mas também e sobretudo da ordem pública, tornava desnecessária a sua existência. Encontramo-lo já nos forais mais antigos, nos burgos, e, geralmente, nos forais da órbita de Coimbra, o de 1179 incluído, assim como nos do grupo de Évora.

        Nos forais do grupo de Lisboa, os assuntos da ordem policial são tratados na dependência de um magistrado especial, o pretor. No exercício dessas funções, é coadjuvado por outros funcionários menores, como o saião e o porteiro.

        O mordomo, por vezes também chamado “vicário” (vigário) ou serviçal, é o funcionário a quem compete a recolha dos tributos, e, em geral, todas as exacções fiscais, e é por essa razão que intervém muitas vezes em assuntos de justiça, a título de cobrança das multas resultantes das várias coimas. É a esse propósito que se refere o meirinho nos forais de Seia e de Banho, mas, tal como sucede no do Porto, e nos dos grupos de Numão e de Évora, esse nome designa um funcionário com as mesmas atribuições do mordomo, de modo que, justamente, os forais do subgrupo da Covilhã substituem uma palavra (meirinho) pela outra (mordomo). Os povos temiam as extorsões dos mordomos régios e senhoriais e, por isso mesmo, os concelhos de localidades de pequena e média dimensão preferiam encarregar-se directamente da cobrança e pagamento de todos os foros, impostos e coimas, quer directamente, quer através da nomeação de um mordomo próprio. Porteiro é também, algumas vezes, sinónimo de mordomo, embora em geral designe um funcionário subalterno.

        A expansão das actividades económicas tornou necessário o aparecimento dos almotacés que encontramos referidos pela primeira vez nas Posturas Municipais de Coimbra, em 1145, e depois figuraram em todos os forais do grupo de Lisboa, de 1179.

 

        4. A justiça

 

        A nível das normas adoptadas na administração da justiça, não obstante a sua ausência, em certos forais – especialmente no caso de Coimbra, onde seriam dispensáveis em face de uma arreigada tradição jurídica –, e, nos outros, o seu carácter breve e fragmentário, podemos, desde os mais antigos tempos, verificar uma preocupação muito grande com o respeito dos direitos individuais, e com a protecção aos mais fracos.

        Certas disposições que inicialmente se apresentam como privilégios – a equiparação dos cavaleiros vilãos aos infanções, e dos peões aos cavaleiros – teriam o objectivo de proteger os moradores dos municípios contra as prepotências dos mais poderosos. Não escasseiam as disposições tendentes a combater as tendências extorsionárias das autoridades e funcionários. O próprio direito de asilo concedido expressamente a tantos municípios, se, por um lado, é o meio de favorecer a afluência de moradores, é, por outro, o meio de evitar ingerências que perturbam a paz interna, em complemento das severas sanções cominadas contra quem pretenda violar o couto estabelecido pelos forais.

Certos princípios depressa se generalizam:

– Ninguém pode ser chamado a responder perante a justiça, sem que haja “rancura”, isto é, uma queixa expressamente formulada;

– Ninguém pode ser condenado por simples “apostila”, isto é, por acusação sem apresentação de provas, e sem “inquisa” ou “exquisa”, isto é, sem averiguação dos factos, levada a cabo por pessoas idóneas, ou seja, por homens-bons;

– A ninguém se podem subtrair ou cativar bens, isto é, fazer penhoras, que não sejam determinadas por uma sentença prévia;

– O réu pode apresentar fiança, quer sob a forma de uma caução material, quer pela apresentação de um fiador, como garantia de que no prazo devido cumprirá as suas obrigações, evitando assim a prisão, se não puder satisfazer de imediato certas obrigações;

– Para se libertar de qualquer suspeita, é suficiente o juramento corroborado por testemunhas abonatórias;

– São punidas as testemunhas falsas, que além disso perdem a credibilidade em relação a acções futuras;

– Só raramente se adopta o castigo físico, consistindo as penalidades em multas, inicialmente fixadas em géneros, e, com o evoluir da economia, em valores monetários.

Estas orientações, como vemos, em nada desdizem dos tempos actuais, e mostram-se até bastante avançadas em relação a algumas práticas adoptadas em séculos posteriores.

 

5. A sociedade.


       

        5.1. As diferenças sociais.

A grande virtude dos nossos antigos municípios estava na igual participação de todos na vida pública local. Mas esta igualdade não significava igualitarismo social. Havia, com efeito, dentro dos municípios gente com posição social diversa. E se, nos municípios com alfoz de pequena e média dimensão situados a norte de Coimbra, é claro o movimento para acabar com todas as formas de servidão, outro tanto não podemos dizer em relação aos que receberam algum dos forais dos três grandes grupos (Numão, Salamanca, Lisboa), onde uma parte dos moradores pode ou mesmo deve ter dentro das suas herdades diversos trabalhadores – os solarengos – , que lhe permanecem vinculados, por certos laços, designadamente no que se refere à administração da justiça. E, de par com os escravos mouros, não se esqueça o estatuto especial dos mouros forros que constituiriam grandes comunidades em várias cidades ao sul de Coimbra.

        5.2. Peões e cavaleiros. Besteiros e clérigos.

Na maior parte dos municípios há moradores com dois estatutos diferentes: os cavaleiros e os peões. Os cavaleiros possuem cavalo, para com ele participarem nas actividades militares, e, em compensação, estão isentos dos impostos sobre os rendimentos agrícolas ou sobre a caça. Certos cavaleiros entram nessa categoria por descendência familiar, outros podem ascender a ela, se tiverem meios, mediante a aquisição do cavalo e das armas correspondentes. Em alguns casos – e, por regra geral, nos municípios onde integralmente se adoptou o foral de Évora – é mesmo obrigatória essa promoção, com a prévia aquisição do cavalo, para quem beneficiar de uma determinada posição económica. Aos cavaleiros são equiparados os besteiros, mencionados a partir dos finais da década de trinta. As funções de chefia militar competiam ao alcaide e aos adaís.

Os clérigos beneficiam de idêntico privilégio tributário, e, a partir dos anos quarenta, declaram-se isentos das obrigações militares.


        5.3. Os jugadeiros.

A maioria da população é constituída pelos agricultores, militarmente classificados como peões, e fiscalmente incluídos na categoria dos tributários, ou dos jugadeiros ou  jugárioss, se quisermos adoptar uma terminologia mais adequada à região de Coimbra. Não esqueçamos porém que nos burgos prevaleciam os mercadores, cabendo-lhes também um papel preponderante nas principais cidades, especialmente nas do centro e sul, e que, além dos carniceiros, padeiras e almocreves, a partir da década de trinta, os documentos revelam o incremento dos mesteres, especialmente dos ferreiros, oleiros, fazedores de telha, conqueiros, peliteiros e sapateiros.

 

6. A fiscalidade.

 

A carga tributária é diversa de região para região, de grupo para grupo de forais. Os géneros ou actividades tributadas variam também, conforme o tipo de economia característico do município.

        6.1.Imposto sobre a casa e as bancas de comércio.

Nos burgos e póvoas do noroeste, o imposto fundamental, a liquidar pelos moradores, corresponde à casa, com uma tributação idêntica para as bancas dos carniceiros; os mercadores, sobre as mercadorias que vendem, dão uma portagem, cuja tabela está previamente fixada.

        6.2.Tributos sobre a produção agrícola: jugada, ração,pagamento por casal ou courela.

As populações dos municípios de cariz exclusiva ou marcadamente agrário pagam um tributo correspondente a uma percentagem da produção agrícola. Há três critérios seguidos na fixação do tributo, a pagar em cereais (que podem incluir o trigo, o centeio, o milho, a cevada, e a aveia, e em geral abrangem pelo menos duas destas espécies):

– desde os tempos mais antigos, nas áreas de Coimbra e de Viseu dá-se a jugada, isto é uma contribuição maior ou menor, conforme se trabalha com um jugo de bois, com mais ou com menos; as excepções podem estar em relação com a diversa procedência dos moradores; os cavões, isto é os cultivadores de parcos recursos, sem gado para lavrar a terra, vêem o seu imposto condonado ou reduzido;

– mais para norte, na terra de Panóias, e após os meados do século, o tributo é fixado por courela ou casal, independentemente do uso ou até da existência de gado; o mesmo critério é seguido em algumas localidades, não muito distantes das anteriores, mas situadas a sul do rio Douro, nas partes setentrionais do distrito de Viseu;

– em algumas localidades segue-se o critério da ração, isto é, da percentagem sobre o total da colheita: estão nesta categoria Godim, no sul da terra de Panoias, Moimenta, Parada, Mouraz, Guardão e Ferreiros na vertente ocidental do distrito de Viseu, e, isolada, S.ª Marinha, nas proximidades de Seia. Talvez este critério corresponda a uma tendência que alastra em fins do século XII e princípios do século XIII.

E, se em relação ao linho o critério é praticamente o mesmo, de dar uma certa porção quando o há, em todo o lado, variando a penas as quantidades, já em relação ao vinho são díspares as determinações: uma quantidade fixa, desde que a produção vá além de certa medida (Penela, Sernancelhe, Sintra, Leiria...); ou também por ração, em percentagens que variam de localidade para localidade; ou um quantitativo fixo por courela ou povoador, critério predominante na terra de Panóias.

        6.3. Paradaou colecta e vodos.

Nesta zona, assim como em localidades próximas situadas na margem sul do Douro, os agricultores são ainda sobrecarregados com outros impostos, designadamente com a parada ou colecta e os vodos ou votos.

A taxação dos “vodos”, “bodos” ou votos, na terra de Panóias, conta-se entre as mais antigas referências locais aos célebres “votos de Santiago”, sobre cujo destino a documentação que estudámos não fornece esclarecimentos.

A parada é o único imposto geral, para que são obrigados a contribuir os habitantes dos municípios que receberam o foral de S. João da Pesqueira, além da taxa proporcional à quantidade de peixe recolhido nas pesqueiras do Douro ou afluentes. Os moradores de Bragança pagam apenas três dinheiros de colecta, por ano, se o rei visitasse a vila.

        6.4. O mel e acera.

O valor que têm então o mel e a cera, o primeiro sobretudo na alimentação, e a segunda na iluminação, a começar pela das igrejas, numa época em que ainda se não difundiu o uso do açúcar, e muito longe vinham o petróleo e a luz eléctrica, ajudam a compreender o valor da extracção do mel e da cera, tão abundantes em certas áreas que os documentos os apresentam ainda a ser explorados ao nível da simples recolecção, mas como ocupação exclusiva ou predominante de alguns membros da população, que são esses os únicos a pagar tributo por tal actividade, em localidades como Azurara da Beira, Ferreira de Aves, Seia, Santa Marinha, Miranda do Corvo, Leiria, Redinha, Abiul, Sintra, Vila Boa do Mondego, Arouce e Moimenta. A cera, como o azeite, aparece também nas tabelas de portagens dos forais dos grupos de Lisboa e de Évora.

        6.5. Os legumes.

Em algumas localidades são tributados os legumes (feijões, favas...), testemunhando o valor que lhes era atribuído na economia e na alimentação: é o caso de Sátão, Moimenta, Santa Marinha, Valdavim, Santa Comba e Treixede, ao sul do Douro, e de Celeirós, na terra de Panóias.

        6.6. A caça.

Em grande número de municípios paga-se imposto sobre a caça, e, quando um rio os atravessa, sobre a pesca. Há dois tipos de caça: a que tem por objecto os animais maiores, que na época abundam no país (urso, cervo, javali), e que normalmente se faz de “peias” ou “baraças”, isto é, com armadilhas ou laçadas: dá-se então, de tributo, uma parte do animal (ou, possivelmente, o correspondente valor): as mãos (norma geral quanto ao urso), um ou dois lombos, uma espádua ou corazil (presunto). Normalmente, não é tributada a caça feita pelo sistema de batida (quando o animal é “cor[r]udo”, isto é, corrido, como dizem os documentos). A caça ao coelho faz-se de “morada”, isto é, permanecendo, a caçar, durante a noite, no monte, e o tributo depende em alguns casos do tempo por que se prolongar a “morada”. Talvez por causa dos riscos que implicaria, a caça, já tributada no foral de S. João da Pesqueira, não é mencionada nos paradigmas dos grandes forais das áreas de fronteira (Numão e Évora), tal como nos forais da zona nordestina de Bragança.

        6.7. Portagens.

Os forais que incluem taxas de portagens, relativamente completas, para a economia da época, são os dos burgos do norte e os dos grandes núcleos urbanos do centro e sul do país, incluídos nos grupos de Lisboa e de Évora. A partir de agora deixa de ter sentido a diferenciação dos burgos, organizados segundo o esquema selectivo e fechado adoptado pelos mercadores francos, que aliás sofreu o primeiro golpe, quando D. Afonso Henriques confirmou o foral de Guimarães, ao admitir dentro da povoação gentes de vários estratos sociais.

        6.8. Forais de fronteira.

        A leveza da carga fiscal é, aliás, por razões compreensíveis, a grande característica dos forais típicos das áreas de fonteira, ainda que posteriormente sofram adaptações, ao serem outorgados a outras localidades: é o caso dos forais dos grupos de Numão e de Évora. No primeiro destes grupos, o tributo geral resume-se também à colecta (uma oitava de moio de cevada, dois pães e um dinheiro); em Évora, os moradores pagam impostos somente sobre os lucros de guerra, enquanto o montádigo e as portagens recaem apenas sobre os estranhos, como nos burgos do norte do país. Tirando as pequenas comunidades agrárias da terra de Panóias e arredores, os forais do grupo de Lisboa são aqueles em que mais árduo se revela o fardo tributário: jugada, paga pelos agricultores, tributo sobre a caça, décima a liquidar pelos artesãos, impostos sobre o comércio e a almocrevaria, “judicato”, alcavala, alcaidaria, portagens a liquidar pelos mercadores vindos de fora, e nem as padeiras se eximem à taxa sobre o pão.

        6.9. Impostos arcaicos.

Esporadicamente citam-se, aqui e além, certos impostos arcaicos, como a lutuosa, o maninhádego, e as “osas” matrimoniais, cuja tendência se encaminha no sentido do seu desaparecimento.

Em contraposição, e salvo raras excepções, generaliza-se o reconhecimento aos agricultores do direito a dispor da propriedade, por doação ou venda, sem pagamento de direitos dominiais, mas impondo a condição de o adquirente continuar sujeito aos mesmos foros.

 

7. Conclusão.

 

O municipalismo português tem as suas raízes nos séculos XI e XII, no período que vai da concessão do foral a S. João da Pesqueira por Fernando I, o Magno, o primeiro outorgado em terras actualmente portuguesas, até às confirmações realizadas nos tempos de D. Afonso II, em 1217 e 1218, correspondentes ao início de uma política de maior controlo dos municípios, já anunciada nas cortes de 1211, quando El-Rei “estabeleceo juízes convem a saber que o reyno e todos que en el morasem fosem per ele regudos”, o que, se por um lado explicita a intenção de acabar com o foro judicial privado, designadamente dos nobres, e de incrementar uma administração mais equitativa da justiça, por outro lado anuncia a tendência para a centralização dos poderes, em detrimento das autonomias municipais, fazendo assentar a organização civil do reino não nos municípios, mas nos julgados, de cuja existência nos dão testemunho as Inquirições de 1220.

O período verdadeiramente criador e português – podemos dizer, o período áureo do nosso municipalismo – situa-se entre 1096 e 1187, isto é, inicia-se com a outorga do foral de Guimarães e concluiu com a assinatura do foral de Bragança. É durante esse período que surgem os vários paradigmas de cartas de foro municipal, ajustadas às contingências e necessidades dos homens e dos espaços geográficos, aos objectivos circunstanciais e às realidades históricas. A partir daí nada mais acontece do que a repetição dos paradigmas existentes, aplicando-os, sem grandes alterações de fundo, a outras localidades.